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Mitologia em Português

12 de Julho, 2017

O segredo do "Credo" cristão

Independentemente da versão do Cristianismo que se conheça, uma das orações mais famosas é certamente a do Credo. É recitada na missa, como se de uma verdadeira ladainha se tratasse, mas muito poucos são aqueles que se interrogam sobre o seu conteúdo. Portanto, este artigo começa com um pequeno convite à reflexão - caro leitor, se conhece esta oração, pense nela. Pense, em particular, no que é dito nas suas linhas.

 

O que queremos dizer quando dizemos que "[Jesus foi] gerado do Pai antes de todos os séculos"? "Luz da luz"? "Gerado, não criado"? "Consubstancial"? Ou que a igreja é "una, santa, católica e apóstolica"? Explicar cada matiz não é simples (fazê-lo implicaria, muito provavelmente, levar a maior parte dos leitores a uma sonolência evitável), mas podemos explicar de onde vêm essas diversas ideias, no seu modo geral.

 

O essencial do Credo nasceu de um conjunto de tradições orais que, alegadamente, vinham ainda do tempo dos apóstolos, e que principiavam por "Creio em Deus, o Pai omnipotente, e em Cristo Jesus o seu único filho, nosso Senhor". Uma versão provavelmente posterior, conhecida como Credo dos Apóstolos, começava por "Creio em Deus, o Pai omnipotente, criador do céu e da terra. Creio em Jesus Cristo, o único filho de Deus, nosso Senhor". São semelhantes, mas não iguais. Estas eram as orações basilares da época, que se destinavam a dizer algo como "eu acredito em X".

 

O grande problema começou quando dizer "eu acredito em X" deixou de ser suficiente. Algumas pessoas começaram a interrogar-se, por exemplo, se Jesus teria sido criado antes ou depois do primeiro dia da criação bíblica - se Deus é eterno, será que este seu filho também o era? E o Espírito Santo, precede-o? São, hoje e para nós, questões bastante secundárias, mas existiu um período de tempo em que eram de uma suma importância, já que a fé cristã ainda se estava desenvolver.

 

Então, voltando às duas linhas citadas acima, tenha-se em conta que nunca é dito que só existe um deus - as pessoas acreditavam em Deus, mas segundo aquelas linhas nada implicava que não venerassem outras figuras divinas. Quando Valentino, no segundo século da nossa era, propôs que os deuses do Antigo e Novo Testamentos não eram o mesmo, nada existia explicitamente no Cristianismo que o impedisse de afirmar isso. Portanto, mais tarde foram adicionadas sequências como "[Creio] em um só deus" e "criador do céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis", para formalizar que o verdadeiro cristão só podia acreditar em Deus (o que afasta ideias basilares do politeísmo, mas também a infinidade de divindades da religião de Valentino), e que essa figura divina tinha criado tudo o que existe - mesmo coisas que não conseguimos ver, como as figuras dos anjos.

 

Mais tarde surgiram ideias de que Jesus podia ter sido a primeira de todas as criaturas. Novamente, nada de muito explícito contra isso existia na doutrina da altura, e então foi adicionada a ideia de que ele teria sido "gerado, não criado", sendo por isso "consubstancial" a Deus, por oposição à matéria (fosse ela qual fosse...) que revestia a criação de todos os outros seres.

 

Em suma, podemos dizer que às orações originais, atribuídas aos apóstolos, foram sendo adicionadas novas cláusulas para proceder à defesa de uma ideia muito particular do Cristianismo. Quando, na liturgia cristã, se recorre ao Credo, é essencialmente para afirmar um conjunto de fórmulas que deveriam dizer "enquanto cristão, hoje e agora eu acredito em X", mas cada vez menos pessoas parecem pensar nessas afirmações que fazem, tornando-se as fórmulas originais em pouco menos do que palavras vazias.

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